segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Curiosidades fronteiriças: Casa de Bastos (Alto dos Três Termos)

A Raia tem essas coisas que não por serem realmente curiosas, deixam menos de surpreender. É o caso de uma herdade situada na mesma linha de fronteira, perto do Alto dos Três Termos. Este alto é realmente uma pequena lomba não muito elevada (521 m.) em que confluem os termos dos concelhos de Arronches e Portalegre e o município da Extremadura espanhola de La Codosera. 

A herdade, conhecida como Casa de Bastos, está situada a pouco mais de 480 m. de altitude e a uns 2 km. da aldeia da Tojeira, que pertence ao município de La Codosera e da qual já falamos neste blogue, e a uns 3 km. da aldeia de Besteiros, situada na freguesia de Alegrete, no concelho de Portalegre, em pleno Parque Natural da Serra de São Mamede. Lá perto fica ainda o Monte de Parra, na freguesia de Mosteiros, no concelho de Arronches e que está unida à Tojeira por uma estrada local que atravessa a Ribeira de Abrilongo.

A fronteira está delimitada por uma série de caminhos rurais de terra batida e a herdade fica no meio do pequeno vale situado entre o Alto dos Três Termos e a Serra de Bastos, alinhamento montanhoso que segue a linha de fronteira e que atinge os 600 m. de altitude. O acesso pode fazer-se a partir da estrada que liga a Tojeira com a aldeia vizinha de Bacoco ou pelo caminho de terra batida que de Besteiros liga ao limite fronteiriço. A região é na realidade uma bela floresta na que domina o sobro e o azinho e na que são patentes umas características climatéricas próprias de uma maior humidade no território, talvez pela proximidade da Serra de S. Mamede, que daria lugar a uma maior abundância de precipitações. 

A herdade é, na realidade, um monte alentejano típico, apesar de situado já em Espanha. Isso não deve surpreender-nos porque não será senão um resultado da segunda vaga migratória de população portuguesa para os territórios fronteiriços vizinhos. Se já houve uma primeira vaga no século XVIII na região circundante de Valência de Alcântara, esta segunda vaga teve lugar no último quartel do século XIX. Nisso teve muito que ver o Tratado de Limites de 1864 que definiu os limites fronteiriços nos trabalhos que decorreram até 1868. Até esse momento eram muito frequentes as chamadas «contendas», territórios pouco definidos, em terra de ninguém, que costumavam ser aproveitados como espaços para a exploração pecuária pelos camponeses dos municípios de um e do outro lado da fronteira como foi o caso da Contenda de Arronches. Obviamente, essas terras, pela sua indefinição jurídica, costumavam ficar desertas, isto é, não existia um povoamento estável de relevância. A delimitação da fronteira clarificou muito a situação do ponto de vista jurídico, o que permitiu o aparecimento de pequenas aldeias que foram povoadas por portugueses dos concelhos vizinhos no que hoje é o município de La Codosera. Daí que os nomes sejam claramente portugueses: Marco, Tojeira, Bacoco ou Rabaça são bons exemplos disso. A língua portuguesa é presentemente um facto, até porque a maior parte dos seus habitantes não romperam o cordão umbilical com a pátria e há até quem conserve a nacionalidade portuguesa ou mesmo só tenha esta.

Daí que, mesmo já em terras espanholas, não nos seja estranho o território, inclusive quando o casario apresente, por via de mimetização, alguns elementos de mistura próprios da tradição da Extremadura espanhola como podem ser os gradeamentos nas janelas. Não podemos esquecer que a Raia do Alentejo com a Extremadura espanhola é das que menos diferenças apresenta do ponto de vista da paisagem porque ambas as duas regiões caracterizam-se por uma estrutura da propriedade em que domina a grande propriedade latifundiária e a paisagem de montado e de searas como formas tradicionais de exploração agrária e pecuária.

Fica, pois, mais uma amostra das curiosidades que podemos encontrar na Raia num simples passeio de tarde por estes recantos tão pouco conhecidos.

Foto 1. Marco fronteiriço visto do lado de Portugal.
 Foto 2. Marco fronteiriço visto do lado de Espanha.
 Foto 3. Caminho fronteiriço em que a fronteira discorre pela vedação de arame farpado.
 Foto 4. Herdade de Casa de Bastos e linha de fronteira (os cães não ligam nenhuma a isso!!!)
 Foto 5. Caminho fronteiro na direcção do Alto dos Três Termos.
Foto 6. Floresta de azinho e sobro do lado português, no termo de Besteiros, freguesia de Alegrete.



Mapa 1. Mapa de situação.


Mapa 2. Mapa específico.

Sem comentários:

Enviar um comentário